Vista do Kilimanjaro: Face sul do Kibo ao por do sol
View from Kilimanjaro: Kibo's southern face in the sunset
Ficamos pouco mais de 1 hora no topo da África: o pico Uhuru no Monte Kilimanjaro, a 5895m de altitude, no norte da Tanzânia, junto à fronteira com o Quênia. Agora, passados quase 3 meses, percebo que é quase impossível recordar as emoções daqueles momentos preciosos. Mesmo na hora, era difícil saber exatamente o que eu estava sentindo. Era uma sensação mista de sonho e de descrença em estar vivendo uma experiência única em um lugar tão especial cujo visual é arrebatador: De lá, naquele momento era possível observarmos a leste o sol nascer acima do Monte Mawenzi (o segundo maior pico do Kilimanjaro com 5149m), provavelmente o nascer de sol mais bonito que vi na vida; a lua cheia que nos acompanhou durante toda a subida ao cume ainda brilhava distante do horizonte a oeste; o que seria todo o interior de uma enorme cratera vulcânica ao norte e as famosas geleiras e neves eternas do Kibo (o maior dos 3 picos do Kilimanjaro) estendendo-se por todo o lado sul, isso tudo em meio a uma vasta planície de savana.
We lingered on top of Africa for a little over one hour: on Uhuro peak in Mount Kilimanjaro, at an altitude of 5895m, in the North of Tanzania, right on the border with Kenya. Right now, almost three months later, I realize that it is almost impossible to remember the emotions from those precious moments. Even at the time it was difficult to know exactly what I felt. It was a mix of a sensation of a dream coming true and disbelief to be living such an unique experience in such a special place and such a breathtaking vista. At that moment we could see the sun rising on the East over mount Mawenzi (the second tallest of Kilimanjaro's peaks, 5149m tall), probably the most beautiful sunrise I've ever seen in my life. The full moon that followed us during the whole climb still shone far from the horizon, to the West. The whole of a vast volcanic crater stretched to the North, and the famous glaciers and eternal snows on Kibo (the tallest of Kilimanjaro's three peaks) spread itself to the South. All of this right in the middle of endless savannah plains.
Vista do Topo da África. Ao fundo: Monte Mawenzi. À direita: As neves eternas do Kilimanjaro
The view from the top of Africa. In the
background: Mount Mawenzi. To the right: Kilimanjaro's eternal snows.
Estavam comigo os três que me fizeram companhia ao longo de toda a jornada: minha prima Cláudia e os guias locais Nechi e Chayo, sem os quais, não seria possível chegarmos lá. Diversos caminhos levam ao cume e o que escolhemos percorrer o mais popular, a rota Machame, também chamada de rota “Whisky” pelo grau de dificuldade (a rota mais tranquila é chamada de rota “Coca-cola”), mas considerada como a rota mais bonita.
Embora o Kilimanjaro não seja considerado uma montanha de difícil escalada, qualquer escalada que requer vários dias para se completar não deixa de ser uma experiência intensa e desafiadora. De fato, não se trata de uma escalada, pois não exige nenhuma técnica especial de alpinismo, mas é necessário um bom preparo físico e no tão esperado dia de ataque ao cume, o desafio se mostrou bastante respeitável. Neste dia, para percorrer a distância de aproximadamente 5 km que separa o acampamento base (Barafu Camp a 4673m de altitude) do cume, levamos mais de 7 horas.
Apesar dos cuidados que tomamos com a alimentação e a preparação (inclusive optando por realizar o percurso em 7 dias para melhor aclimatação ao invés dos costumeiros 6 dias dos pacotes mais populares), durante esse percurso final, pudemos experimentar alguns dos efeitos mais comuns causados pela alta altitude como dores de cabeça, enjoos e outros desarranjos. Por conta também do cansaço extenuante, tivemos não apenas que fazer paradas adicionais não previstas como também passamos a caminhar em um ritmo mais lento do que o já lento ritmo pole pole (devagar em Swahili) habitual, para que pudéssemos continuar em frente.
A parte final do ataque ao cume é particularmente difícil não só pelo evidente cansaço. Além de ficar cada vez mais íngreme, o terreno também começa a ganhar uma consistência arenosa e com isso, cada passo que dávamos para acima era acompanhado de um deslize de volta para baixo tornando a luta tanto física quanto mental. A partir desse ponto, passei a sentir a necessidade de descansar a cada 5 minutos por causa da exaustão e sede. A água que carregava comigo em garrafas plásticas já estava parcialmente congelada, o que indicava que a temperatura já estava a alguns graus abaixo de zero e o frio que até então estava suportável, agora começava a incomodar.
Porém, nada havia nos preparado para o desafio que viria a seguir: a volta.
Depois de encarar a disputa com os outros turistas pela vez para tirar as fotos junto da placa que marca o local do cume, eu estava tão exausto e com as pontas dos dedos tão geladas que não aguentava mais focalizar as paisagens deslumbrantes no visor da câmera. Ajustei então o zoom no ângulo máximo e entreguei a câmera para minha prima, que assim saciou a inquietação que vinha alimentando desde quando sua câmera quebrou ainda na metade do caminho.
Após um rápido descanso começamos a descida. O caminho de volta não é o mesmo da ida e os mais de 4000 m de altitude que conquistamos em 6 dias de caminhada são vencidos em apenas um dia pela rota mais curta e usada apenas para a descida conhecida como rota Mweka. Trata-se de um caminho extremamente íngreme e escorregadio que leva de volta ao acampamento Barafu, depois para o acampamento Mweka e daí para o início da rota.
Along with me were the three people who tagged along through the whole journey: my cousin Cláudia and the local guides Nechi and Chayo, without whom it would be impossible to get there. There are several paths to the summit, and we chose to tread on the most popular one, the Machame path, also known as the “Whisky” path for its high difficulty level (the easiest path is called the “Coca-Cola” path), but also the most scenic one.
Even if the Kilimanjaro is not considered a tough mountain to climb, any climb that takes several days to complete is still an intense and challenging experience. Indeed it might not even be considered a climb at all, since it doesn't require any special mountaineering techniques, but a good physical condition is essential and, on the day we tackled the way to the summit, the challenge proved to be a considerable one. From the base acampment (Barafu Camp, at an altitude of 4673m) to the summit there's a distance of approximately 5 km, which we took over seven hours to go through.
Despite all our attention to nutrition and conditioning (we even chose to make the journey in seven days instead of the usual and most popular 6-day trip packages, so we could adjust better to the environment), we experienced some of the most common side effects of the high altitude during this last stretch: headaches, nausea and other misgivings. Also due to the exhaustion we had not only to take additional and unplanned breaks, but also to walk at a speed even lower to the already slow “pole pole” (“sluggish” in Swahili) pace, just so we could go forward.
The final attack to the summit is particularly difficult, not only because of the plain weariness. The ground not only becomes steeper and steeper, but also sandier, so that each step upward was followed by a slide downward, making the struggle not only physical but also psychological. From this point forward I felt the need to rest every five minutes, such the fatigue and thirst I felt. The water I brought with me in plastic bottles was almost completely frozen by now, an evidence that the temperature was by now a few degrees below freezing, and the cold, until that moment just a nuisance, now became a problem.
Nothing had prepared us to the next challenge, however: the way back.
After we got past some contention with the other tourists for the chance of taking our pictures by the sign that marks the summit's location, I was so weary and my fingertips were so frozen I wasn't able to focus those spectacular vistas on my camera's screen anymore. So I set the camera's zoom to wide angle and handed it to my cousin, who was then able to put to rest the anxiety she nurtured from the moment her camera stopped working halfway up the mountain.
After a short break we started to descend. The way back is not the same as the one up, and the more than 4000m of altitude we took 6 days of walk to conquer go past us in just one day through a shorter route, used only to go downhill, known as the Mweka route. It's an extremely steep and slippery path that takes us back to Barafu camp, next to Mweka camp, and then to the beginning of the original path.
Vista da Rota Mweka: Descida do Kilimanjaro
The vista from Mweka route: descending the Kilimanjaro
The vista from Mweka route: descending the Kilimanjaro
O último trecho do caminho é um passeio agradável, mas o primeiro é uma verdadeira prova de resistência e velocidade, no nosso caso ainda acentuda porque como demoramos para chegar ao cume, já partimos de lá atrasados (nossa equipe de carregadores ainda teria que desmontar nossas barracas no acampamento Barafu após um breve descanso nosso para então voltar a monta-lo no acampamento Mweka onde iríamos passar a última noite).
Sentimos-nos como numa corrida nas dunas, usando a gravidade para chegar logo à linha de chegada no acampamento base. Descíamos como se estivessemos patinando, deslizando os pés, mas mesmo deslizar é uma dificuldade, pois o terreno além de pedregoso e todo irregular ainda é instável.
Se o tempo estivesse pior, eu provavelmente teria encontrado forças para descer deslizando mais rápido e acompanhar o ritmo dos demais, mas depois de sentir por várias vezes a fadiga dos músculos das pernas e as descargas de ácido láctico, começei a sentir pena dos meus dois joelhos – ambos já submetidos à cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado posterior – e, detestando a experiência toda, continuei deslizando lentamente no limite da dor.
O sol já estava alto e o frio congelante sentido no cume deu lugar a um calor intenso que tornava ainda mais agonizante essa descida. Mais uma vez tivemos que parar para descansar. Mas dessa vez, já o pior já havia passado, estávamos agora a poucos metros do acampamento base. O mundo estava acendendo ao sol da manhã é a vida era maravilhosa. Tínhamos subido o Kilimanjaro e em breve estaríamos de volta ao conforto de casa.
Neste momento, abracei minha prima e não me lembro o que dissemos um para o outro; provavelmente algo banal, mas me lembro vividamente da sua expressão de alívio por termos conseguido chegar lá e do profundo sentimento de amizade que aflorou enquanto percorríamos juntos o último trecho dessa aventura inesquecível.
The last part of this route is a lovely walk; the first one, however, is a genuine test of endurance and speed, even more for us, who took longer to get to the summit and therefore left it behind schedule (our team of load bearers still had to put our encampment down in Barafu camp after we took a short break, so they could put it up again at Mweka camp, where we'd spend our last night).
We felt as if we were in a race among the dunes, using gravity in our favor to cross the finishing line at the base camp as soon as possible. It felt as if we skated our way down, feet skidding, but even sliding downhill is not easy, for the ground is rocky, irregular and uncertain.
Had the weather been uglier I'd probably had found the inner strength to slide faster downhill and catch up with the rest of the troupe, but after feeling my legs' muscles exhaustion and lactic acid shoot through them a little too often, I began to have mercy of my knees – both of which had undergone reconstructive surgery on their posterior cruciate ligament – and, hating the whole experience, kept on sliding downhill slowly, on the limits of my pain.
The sun was up, and the freezing cold we felt at the summit gave way to an intense heat that made the way down even more unbearable. Once more we had to stop to rest. By this time the worst was already behind us, we found ourselves a few meters away from the base camp. The world was lit by the morning sun and life was wonderful again. We had climbed the Kilimanjaro, and soon we'd be back to our home's comfort.
At this moment I hugged my cousin. I can't remember what we said to each other; probably nothing special, but I vividly remember her expression of relief for having made it and the profound friendship that we cultivated while we made together our way through the last stretches of this unforgettable adventure.
Nós e o time de guias e carregadores que tornaram possível a aventura. Acima à esquerda: Cláudia. À direita: Daniel
The both of us and the team of guides
and bearers that made this adventure possible. Top left: Claudia. Right: Daniel
Nenhum comentário:
Postar um comentário